13 de novembro de 2009

PARTE II - Ele, Ela e o precípicio ou Possibilidade amorosa

Da maneira mais inusitada eles se encontraram. Dentre os bilhões de seres que habitam esse planeta, justamente eles vieram a se encontrar.

Eles se conheceram mostrando uma alma aberta cheia de boas intenções e, ao se depararem com afinidades, desejos foram evocados e mais tarde foram se misturando tesão, carinho e amizade. Eles se mostraram predispostos ao que queriam, mas mostraram o que queriam mostrar.

Cada pessoa deste mundo não é apenas carne osso e cérebro, é principalmente o resultado de suas circunstâncias e experiências, enfim um complexo subjetivo de idéias e emoções, por assim dizer.

Em cada “infinito particular” há um caminho a percorrer para se atingir a essência do sentimento. Um caminho que percorremos sozinhos e um caminho que o outro percorre, ambos às cegas.

Em suma: cada um tem suas próprias confusões e para amar tem que superar esses obstáculos internos. De giual modo, o outro, aquele que chega, tem que suscitar, sem saber, essa vontade de superação, essa disposição e esperança que irão sobrepor frustrações passadas.

Por outro lado, se deixarmos as frustrações passadas comandarem nossos destinos nos tornamos amargos, frios e a vida fica tão pragmática e cinza que não há muito pelo que viver...apenas sobrevive-se !!

O que é a vida sem a esperança de amar ? O que é um indivíduo que desistiu das outras pessoas e do amor ? De que é feito o Homem que não ama ? Isso existe  -  a renúncia absoluta ao amor ?

No filme Thomas Crown, há uma frase bem interessante, algo como: “dois porcos-espinhos não se abraçam.”. Isso faz pensar: como esses bichinhos se reproduzem ??? (risos). Na verdade, o que o diálogo traz à tona é a inviabilidade de um relacionamento entre duas pessoas que se defendem o tempo todo de sentir.
Amor, paixão, amizade, nenhum sentimento que aproxima ou une duas pessoas tem seguro ou garantia qualquer. Nenhum deles traz certeza, mas um mundo de possibilidades: o inesperado se abre à nossa frente, quando nos abrimos a uma outra pessoa. Todo sentimento é um risco de ganho ou de perda.
Esperem !! Há sim uma certeza: o aprendizado. É impossível relacionar-se com um outro ser humano sem aprender algo e, muitas vezes, é alguma coisa que há tempos queríamos ou precisávamos aprender, quiçá uma peça que faltava no quebra-cabeças do autoconhecimento.
Pois bem. Nos primeiros encontros Ele e Ela pareciam ter iniciado esse processo de conhecimento mútuo e de receptividade recíproca. Pareciam prontos para aproveitar aquele Encontro.

No início, Ela estava cheia de cautelas e ele arrojado, cheio de idéias – imagine um convite pro reveillon em pleno S. João, por exemplo ?...risos.

Ressabiada, ela punha alguns freios no entusiasmo dele; já tinha sido ferida e a última vez demorou a cicatrizar. Sua alma impetuosa tinha se iludido muitas vezes e ela não queria ter que lidar com um novo desengano. Não era dada a superficialidades, mas muitas vezes teve que enfrentar a banalização do que lhe era especial.

Ela tinha medo de se entusiasmar e se ver de novo só e frustrada. No fundo de si, ela guardava a idéia de que a maior reação às feridas, ou ao acaso que lhe desfavoreceu, era a resiliência, a reconstrução de si, a capacidade de tentar de novo...tinha vivido de modo a fazer de si uma Fênix emocional. O renovar de suas esperança no amor e nas pessoas era que a fazia sentir vencedora, pois a amargura era para os fracos de espírito, cuja luz não brotava da tristeza. Não era esperançosa o tempo todo, tinha medos como todo mundo, mas se negava veementemente a ser amarga e conformada e para isso se vigiava constantemente. Porque é preciso vigília para não se deixar abater e apagar pela dor.

Ele, por outro lado, chegou como se tivesse a alma limpa e sem marcas, cheio de autoconfiança como quem superou por completo todas as experiências negativas que já viveu ou como quem nunca amou (só quem nunca amou, nunca sofreu de amor).

Ele desafiou aquela mulher a confiar na sua voz doce e seus olhos de sonho e paz, mas não suportou quando viu esperança nos olhos dela. Talvez nem soubesse quem era até ali, até se ver diante do que ‘não tinha e não sabia se poderia ter’. Como alguém que esconde muitas cicatrizes imperceptíveis aos olhos dos outros, ele se retraiu e a afastou. De doce, passou à secura da objetividade; os sonhos se transformaram em pragmatismos desfavoráveis; possibilidades foram aprisionadas em decretos de inviabilidade e a chance de amar se transformou numa dúvida interminável.

Provável que ele nem mesmo soubesse o tamanho de sua falta de esperança, de sua pouca coragem ou disposição para se abrir diante de uma possibilidade amorosa.

Sim, de um encontro não nasce o amor, mas possibilidade amorosa e , em seguida, outras possibilidades vão surgindo e a cada escolha um caminho vais e desenhando, um caminho muitas vezes inimaginável, completamente inesperado.

À primeira prova de que as coisas poderiam se aprofundar e virar uma história, Ele se retraiu, virou do quase do avesso, mostrou-se o oposto da pessoa que a havia tocado. Conhecem aquela folhinha que se fecha ao ser tocada ??!!

Subitamente, ele agiu como se estivesse certo de que tinha ganho o coração daquela mulher "sem querer". Tolo engano: ele sequer a havia conquistado por inteiro e já começava a perdê-la a cada instante.

Dentro de si, Ela se revoltou com o desengano e se afastou, indignada com a própria capacidade de investir no ser humano e em sentimentos. Ainda não seria dessa vez, pensou. Não seria dessa vez que ultrapassaria a superficialidade que reina nos dias atuais e conheceria por inteiro um outro homem ou que poderia se apaixonar de novo.

Era possível que Ela não tivesse intuição alguma , apenas vontade ? Devia , enfim, resignar-se em alcançar a paz na solidão ? Era esse o caminho a seguir ? Não é possível que o mundo estivesse a lhe dizer isso !!

Ele procurava dentro de si uma escolha: responder àquele chamado ou seguir do jeito que estava ? seria possível nunca pensar em como teria sido entregar-se a Ela ? Agora que a tinha conhecido, que sentiu a vida sussurar no seu ouvido um convite, era possível simplesmente seguir em frente numa marcha seca e ríspida como se nada tivesse acontecido ? Eram tantas promessas nas entrelinhas das conversas, tanta energia no toque e tanta intimidade incompreensível e ilógica quando estava com Ela...  Iria aquilo tudo bagunçar ou reorganizar o seu mundo ?

Postas as cartas na mesa, Ela e Ele tentaram se reencontrar, mas não se sabe que fim isso teve ou terá. Eles ficarão bem, juntos ou não, cada um à sua maneira.


Entendo o que houve com Eles. É difícil atirar-se nesse precipício chamado o Outro. Como bem disse Djavan: “não existe amor sem medo”. Mas como sentir as delícias de amar e ser amado sem buscar em si mesmo a coragem que é indispensável para ser digno de amor ? O próprio Djavan responde na mesma música: "quem não pra quem se dar o dia é igual a noite, tempo parado no ar, calor, insônia."

Covardes até se casam, mas não amam por inteiro. Só aos corajosos a paixão e o amor se mostram em plenitude.

Não se sabe ainda o desfecho desse encontro, mas como esses dois, milhares de pessoas andam se encontrando por aí e deixando de viver possibilidades deliciosas em virtude de medos que nada mais são do que a supervalorização da dor em detrimento da esperança.


No que me diz respeito, mesmo que não haja fé e esperança o tempo todo, mesmo que eu tenha cicatrizes e histórias de horror no baú particular da minha existência, não vou renunciar ao amor nunca. Me recuso a renunciar ao amor. Me chamem de louca, piegas, ridícula, nada disso vai importar...porque cada vez que penso na delícia que é amar e ser amada, minha alma viceja, a vida ganha sentido e a esperança se renova e foi essa a escolha que fiz pra mim: acreditar, apesar de tudo e por causa de tudo. E enquanto o amor não vem, vou vivendo o que houver pra viver.


E você : casou com a solidão ou está apenas esperando o amor chegar ?

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